MEDOS E MONSTROS 

EXPOSIÇÃO 2024

Oi, artistas!

Vamos falar sobre um tema que mexe com todo mundo: medos e monstros. Ao longo da história, esses dois elementos têm inspirado escritores, filósofos, psicólogos e artistas a explorarem o que significa ser humano. Com a nossa expo, vocês vão ter a chance de mergulhar nesse universo 😊 Então, vamos entender um pouco mais sobre esses conceitos pra ajudar vocês a construírem suas ideias com bastante criatividade!

Medo: o que é e de onde vem?

Na filosofia. desde a antiguidade, o medo tem sido um tema de discussão. Platão acreditava que o medo vinha da ignorância, do desconhecido. Para ele, quando não entendemos algo, temos medo. Já Aristóteles via o medo como uma emoção natural, uma resposta a perigos reais ou imaginários, e julgava que é importante sabermos como lidar com ele.

Avançando para a era moderna, Thomas Hobbes, por exemplo, pensava no medo como algo que nos leva a formar sociedades. Para ele, é o medo da violência que nos faz aceitar as regras e viver em comunidade. E, trazendo para um lado mais existencial, Jean-Paul Sartre via o medo como uma consequência da liberdade. Temos medo porque somos livres para fazer escolhas, e isso pode ser assustador.

Na psicologia, o medo é visto de várias maneiras. Freud, o pai da psicanálise, falava que o medo muitas vezes vem de conflitos internos, coisas que a gente reprime e tenta esconder até de nós mesmos. Os monstros, para Freud, podem ser representações desses medos internos, algo que tentamos empurrar para o fundo da mente, mas que acaba voltando para nos assombrar.

Hoje em dia, muitos psicólogos veem o medo como uma reação natural e instintiva, uma forma do nosso corpo se proteger do perigo. Mas também sabemos que o medo pode ser manipulado, por exemplo, em filmes de terror ou na mídia, para causar suspense, tensão ou pânico. E é aqui que entra a arte: como podemos usar o medo para criar algo que provoque emoção e reflexão?

Medos e Monstros na arte: inspirações

Quando pensamos em monstros, podemos lembrar de várias coisas: criaturas mitológicas, seres sobrenaturais ou até mesmo medos mais abstratos, como a solidão ou a morte. Ao longo da história, muitos artistas exploraram essas ideias.

Francisco de Goya é um dos grandes nomes que usou o medo como tema em suas obras. Suas “Pinturas Negras” são cheias de figuras perturbadoras, sombras e monstros que parecem sair direto de pesadelos. Um dos quadros mais famosos é “Saturno Devorando Seu Filho”, onde o medo da morte e da destruição é representado de forma visceral e assustadora.

Figura 1: Francisco de Goya - Saturno devorando o seu filho, 1819-1823
Figura 2: Dois velhos comendo sopa, 1819-1823

Edvard Munch, com seu icônico quadro “O Grito” (Figura 3), capturou o medo e a angústia de uma maneira quase universal. A figura no quadro não é exatamente um monstro, mas o cenário e a expressão de desespero fazem com que a gente sinta o pavor daquele momento. Em “Ansiedade”, é retratada a angústia e o desespero, dessa vez, de forma coletiva.

Figura 3: Edvard Munch, O Grito, 1893
Figura 4: Edvard Munch, Ansiedade, 1894

Existem outras abordagens também acerca do isolamento social e da solidão, que podem causar um medo mais abstrato e inconsciente.

Figura 5: Edward Hopper, Pessoas no Sol, 1960

Edward Hopper, com sua pintura “Pessoas no Sol” (Figura 5), apresenta a sensação de solidão mesmo em um grupo de pessoas. O silêncio e a luz fria contribuem para que pareça que nenhum deles está percebendo a presença do outro.

Os retratos de George Condo (Figuras 6 e 7) representam o grotesco, e estão diretamente ligados ao medo, à ansiedade, ao desassossego e ao isolamento em si. Ao embaralhar as figuras, o artista aponta para os conflitos internos do indivíduo, causados pelas perturbações cotidianas do nosso modo de vida.

Figura 6: George Condo, Duas Cabeças em Vermelho, 2014
Figura 7: George Condo, Facebook, 2017

Na literatura

No campo da literatura, Edgar Allan Poe ficou famoso por seus contos envolventes e aterrorizantes – foi um dos grandes precursores da ficção policial, nos confrontando com o medo do que o próprio ser humano é capaz. Além dos contos, Poe também se consagrou através da poesia, tendo escrito um dos poemas mais influentes da história da literatura, “O Corvo” (Figuras 8 e 9).

Figura 8: Ilustração de Gustave Doré para o poema O Corvo, datada de 1884
Figura 9: Ilustração de Gustave Doré para o poema O Corvo, datada de 1884

Sheridan Le Fanu e Bram Stoker também souberam explorar as fronteiras entre o medo e o encanto, marcando o imaginário popular com criaturas belas, sedutoras e mortais – os vampiros! Suas obras, “Carmilla” e “Drácula” (Figuras 10 e 11), mostram, através de cartas de amor e relatos apaixonados, que o desconhecido não tem apenas o poder de nos amedrontar, mas também de nos cativar com seus mistérios.

Figura 10: Funeral - Ilustração de Michael Fitzgerald para Carmilla em The Dark Blue (Janeiro de 1872)
Figura 11: Ilustração de John Coulthart para o livro Drácula, feita em 2018

Quem também mergulhou profundamente no tema dos medos e monstros foi Mary Shelley, a autora de “Frankenstein” (Figuras 12 e 13). Seu romance, escrito no início do século XIX, não apenas introduziu o icônico monstro criado pelo Dr. Victor Frankenstein, mas também explorou medos muito mais complexos e universais.

“Frankenstein” é uma obra que toca no medo do desconhecido, na angústia da criação que foge ao controle e no pavor da rejeição e da solidão. O monstro de Shelley, embora uma criatura física e assustadora, é também uma metáfora para os medos internos, como o medo da responsabilidade e das consequências de nossos próprios atos. Sua obra influenciou profundamente a literatura de terror e a forma como pensamos sobre monstros e as sombras que eles projetam na humanidade.

Esses autores ajudaram a moldar o imaginário do horror e do medo, inspirando não apenas outros escritores, mas também artistas e ilustradores ao longo dos séculos.

Figura 12: Arte de John Coulthart para Frankstein, de Mary Shelley, edição de 2023
Figura 13: Arte de John Coulthart para Frankstein, de Mary Shelley, edição de 2023

Nos games

Dentro dos games, um exemplo icônico é Silent Hill, uma série de jogos que mergulha fundo nos medos mais primitivos e psicológicos. A cidade de Silent Hill é um lugar onde os monstros que aparecem são representações diretas dos traumas, pecados e medos mais profundos dos personagens. Por exemplo, o famoso monstro “Pyramid Head” (Figura 14) simboliza a culpa e o desejo de punição do protagonista. O jogo utiliza uma atmosfera opressiva, música perturbadora e design de criaturas grotescas para criar um sentimento constante de terror psicológico.

Figura 14: Action Figure de Silent Hill 2 - Pyramid Head, 2024

Um outro excelente exemplo de jogo que trabalha o medo psicológico é “Amnesia: The Dark Descent” (Figura 15). Nesse game, o jogador assume o papel de um personagem que acorda em um castelo sombrio sem memória de quem é ou como chegou lá. O medo psicológico em “Amnesia” é intensificado pela falta de armas para se defender, forçando o jogador a fugir e se esconder dos horrores que encontram pelo caminho.

Figura 15: Amnesia: The Dark Descent, 2010

O jogo usa escuridão, sons perturbadores, e uma mecânica única de sanidade, onde a exposição prolongada ao escuro ou a presença de monstros começa a afetar a percepção do jogador, criando alucinações e aumentando a sensação de pavor. Essa abordagem torna o medo mais psicológico do que físico, explorando a vulnerabilidade e o desconhecido, elementos que mexem profundamente com o estado mental do jogador.

“Amnesia: The Dark Descent” é um exemplo perfeito de como o medo pode ser usado para criar uma experiência intensa e emocional, onde o maior terror não está apenas nos monstros, mas no próprio medo de perder o controle da mente.

Quem acompanha o mundo dos games certamente notou uma recente ascensão de títulos com apelo para crianças, como Five Nights at Freddy’s e Poppy Playtime (Figuras 16 e 17). Ao contrário do que suas criaturas felpudas e cartunescas podem dar a entender, esses jogos não têm nada de fofos – aqui vemos a criação do desconforto e do medo pela mistura de dois universos contrastantes: a inocência da infância e os mais sombrios clichês do horror. Nasce assim uma confusão em nossa mente, que está acostumada a associar este primeiro universo à segurança e acolhimento, e de repente vê seus elementos, como ursinhos de pelúcia e brinquedos, mergulhados em uma atmosfera violenta e perturbadora. Isso explica o arrepio que sentimos ao ouvir uma canção de ninar cantada de forma estranha em uma cena mal iluminada ou ao ver um balanço se mover sozinho em um parquinho, vazio, durante o cair da noite.

Figura 16: Five Nights at Freddy's, 2014
Figura 17: Poppy Playtime, 2021

No cinema

O cinema também tem uma rica tradição de diretores que exploraram o medo de maneiras inovadoras e profundas, criando obras que deixaram marcas duradouras no imaginário popular.

Alfred Hitchcock, conhecido como o mestre do suspense, é um dos diretores mais icônicos nesse sentido. Filmes como “Psicose” (Figura 18) e “Os Pássaros” (Figura 19) são exemplos clássicos de como Hitchcock manipulava o medo e a tensão, muitas vezes jogando com o psicológico do público. Em “Psicose”, por exemplo, ele explora o medo do desconhecido e a vulnerabilidade, enquanto “Os Pássaros” trabalha com o terror do inexplicável, onde criaturas comuns se tornam ameaças mortais.

Figura 18: Psicose, Alfred Hitchcock, 1960
Figura 19: Os Pássaros, Alfred Hitchcock, 1963

Stanley Kubrick também é fundamental quando falamos de medo no cinema, especialmente com sua adaptação de “O Iluminado” (Figura 20). Kubrick usa o isolamento e a deterioração mental do personagem principal para criar uma atmosfera de horror psicológico. O uso de cenários opressivos, a trilha sonora angustiante e a exploração da loucura fazem de “O Iluminado” uma obra-prima do terror psicológico.

Figura 20: O iluminado, Stanley Kubrick, 1980

David Lynch é outro diretor que trabalha intensamente com o medo, mas de uma forma muito mais surreal e psicológica. Seus filmes, como “Eraserhead” (Figura 21) e “Cidade dos Sonhos”, misturam sonhos e realidade, criando uma sensação constante de desconforto e ansiedade. O medo nos filmes de Lynch muitas vezes vem da desconexão com a realidade, onde o familiar se torna estranho e perturbador.

Esses diretores mostraram que o medo no cinema pode ser muito mais do que sustos ou violência explícita. Eles exploraram o terror psicológico, o desconforto, e a tensão de maneiras que continuam a influenciar cineastas e artistas em todo o mundo.

Figura 21: Eraser Head, David Lynch, 1977

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Criando sua ilustração

Ao ilustrar sobre o tema “Medos e Monstros”, vocês podem se inspirar nessas abordagens para criar ilustrações que provoquem uma reflexão ou uma sensação profunda sobre os medos que carregamos dentro de nós.

Pensem o que os monstros e o medo representam para vocês. Será que o monstro é algo externo, como uma criatura assustadora? Ou talvez seja algo mais interno, como um medo que todos temos, mas não gostamos de falar sobre?

Lembrem-se: o medo pode ser tanto sobre algo tangível, como uma criatura que nos persegue, quanto sobre algo mais sutil, como o medo de falhar ou de perder alguém que amamos. Suas ilustrações podem capturar qualquer aspecto disso.

Deixem-se levar pela emoção, pelos sentimentos que esse tema provoca em vocês, e usem isso para dar vida aos monstros que estão dentro e fora de nós.

Boa criação, e que seus monstros te inspirem!

Um abraço ♥